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O Livro em Portugal e o Dilema de Érico Veríssimo.


Érico Verissimo faliu como comerciante/farmacêutico e prosperou como editor e autor e é dele a frase: “quem vive de vender livros o faz porque gosta ou é teimoso”; neste caso, um Editor certamente comete os dois pecados... Quanto aos escritores, são seres de outro planeta, veja, o mesmo Érico parou a trilogia de O Tempo e o Vento (seis volumes em formato gigante e mais de 300 páginas cada) para escrever um livrinho que poucos conhecem, A Noite, em que um desenhista de rostos de cadáveres perambula por emergências de hospitais e velórios para..., continuemos.

Érico foi um gaúcho quase autêntico, usava chinelos de couro, ou alpargatas, entretanto não vestia bombachas com a frequência que a tradição recomenda, isto é, até para dormir. Mas, convenhamos.

Voltando aos livros, o mercado de livros em Portugal, não justifica a choradeira, assim como não é justificável em lugar nenhum e mesmo assim em todos os países reclamam que não há leitores, que falta hábito de leitura, que a educação vai mal... Obviamente, menos em certos países, de acordo com a Agência Central de Inteligência; leu corretamente, CIA, dos Estados Unidos; que publica para quem queira ver o World Factbook, onde Andorra, com seus 77 mil habitantes, Finlândia (5,5, milhões), Groelândia (56 mil), Liechtenstein (34 mil), Luxemburgo (591 mil), Ilha de Norfolk, você sabe aonde é?, tem 2,2 mil habitantes 100% alfabetizados como na Noruega com seus 5,3 milhões de leitores.

Interessante observar que nas colunas “gênero”, atenção, apenas os dois gêneros mais antigos, o masculino e o feminino, os homens lideram na alfabetização e o que isso quer dizer? – Este observador aceita ilações. Triste mesmo é constatar que o continente Africano abriga os países com o menor índice de alfabetização, alguns com pouco mais de 20% da sua população.

Para relaxar, de volta ao Érico, em o Diálogo de Verissimo Pai com Verissimo Filho (livro de crônicas deste que vos escreve) você pode ler que, ao ver o menino recém-nascido, o velho comerciante do interior gaúcho deixou escapar: - que guri feio. Mas isso pode até ser anedota, não merece lembrança. Uma coisa é certa, nem tudo o que é feio, é ruim de ler.

No que toca a quem vive de livros, ou para os livros, nunca foi fácil editar e vender livros. Mesmo nos tempos em que os “poucos” leitores (sempre foram poucos) tinham que aguardar os novos títulos sairem. Não por acaso já houve editor que dissesse aos seus autores: “escrevam, desde que seja uma trilogia”, coincidentemente no berço temporal do romance rio. Assim como viveram autores, como Dickens, que publicavam em “installments”, para a angústia de seus leitores a aguardar os lançamentos no cais do porto... Mais tarde outros repetiram a coisa, a título de teste, como Hemingway, em colunas de jornais, antes de sair o tomo encadernado em capa dura.

Num salto ligeiro no tempo, nasceram os catálogos, inicialmente com 8 páginas tamanho ofício, apenas, e rapidamente preenchendo resmas de folhas de 86x96 dobradas em quatro..., e nunca mais haveria leitores suficientes para os exemplares nas prateleiras, ou leitores ansiosos esperando uma nova publicação. Jamais os editores e livreiros parariam de correr atrás de leitores, os fiéis e os que ainda não adquiriram o hábito da leitura. Surgindo entre desses dois atores, o distribuidor, arrastando livros pelas cidades; e os livreiros tradicionais travando guerra com as mega livrarias que, inicialmente, ameaçaram ocupar um quarteirão inteiro numa cidade, com três andares, a vender de tudo, inclusive livros. Sem falar dos supermercados...

O tempo e o vento, portanto, nos deixou nesta encruzilhada: ou devolvemos o livro ao “Nome da Rosa”, e vamos plantar batatas, ou resolvemos o dilema de Érico Verissimo.

No mundo real, esse dilema não teria sentido, visto, por exemplo, o fabuloso e aprazível ambiente da Feira do Livro de Lisboa, que, enquanto lemos aqui, avança para a linha de chegada, cabeça com cabeça, Santo Antônio e as festas acima do Tejo vencendo pouco a pouco, seguidas pela farra dos coletes vermelhos, antevemos touros correndo pelas ruas de Vila Franca de Xira. Por que então tanta choradeira? – Porque 1,3 livro por ano é pouco! Porque a Venezuela lê mais do que Portugal. Porque as meninas nos últimos anos tem diminuido ainda mais o índice de compreensão da leitura (fonte: PIRLS (Progress in International Reading Literacy Study – estudo da International Association for the Evalutation of Educational Achievment - IEA), e no geral Portugal está entre os piores índices da na Europa... Porque apenas 7% dos alunos que saem do nível básico de ensino revelam nos testes índice satisfatório de compreensão da leitura... Se Portugal está assim, imagine na Terra de Santa Cruz. Entenderão o que lerem, quando adultos? Aprenderão a ler pelo esforço da engrenagem produtiva sócio-econômica? A cadeia produtiva do livro pode contribuir para melhorar esse quadro? Isto é, o seu segmento de mercado?

Curiosamente, segundo outra fonte de estudo, até mais conhecida entre os profissionais do ramo, o PISA, “Programme for International Student Assessment”, os miúdos portugueses apresentam em relação aos demais países da Europa o maior índice pelo gosto da leitura. Isto quer dizer que gostar, não necessariamente significa saber, ou compreender...

Isto posto, a crise existencial da cadeia produtiva do livro tem motivo para ser brutal, mas o erro está mesmo aqui: esquecer que o mercado não é um muro das lamentações.

Embora, agora referindo à qualidade do que é escrito, publicado e comprado, seja mesmo difícil, senão proibitivo, para o Editor, desligar do cérebro a bateria intelectual e vestir várias fantasias ao mesmo tempo; de Public Relation, Marketing, Advertising, Gestor de Custos e Analista Financeiro. Assim, aquele dilema existe de fato. Por isso é preciso ler, ler é preciso. Até bula de remédio.

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